Ilustração: Eloar Guazzelli |
Um de nossos objetivos na realização do filme está em refazer esta antiga trilha indígena chamada Peabiru, utilizada por Garcia. Entre os vários significados para o termo Peaberu, "pe" significa caminho, já à expressão "aberu" ou simplesmete "beru" são atribuídos mais de um significado. Grama amassada ou simplesmente Peru são alguns deles. Há ainda a tradução de que que Pê abê y u significaria caminho antigo de ir e vir. Então estaríamos em busca de refazer o Caminho do Peru ou o Caminho da Grama Amassada, ou ainda o Antigo Caminho de Ir e Vir.
A trilha tinha um importante significado para os antigos habitantes do Cone Sul, ela seria a responsável por ligar o Oceano Atlântico ao Oceano Pacífico. No Alto Peru (atual Bolívia) a trilha ligava-se ao Capac ñan, conjunto de estradas incaicas, onde uma de suas ramificações levava ao Pacífico. A rota tanto servia para interligar diversas tribos, não apenas da Nação Guarani, como também para as tentativas do Império Inca de expandir seu território na direção leste, no que encontravam a resistência guarani. Os guaranis ocupavam uma grande parte do território onde hoje situam-se Argentina, Paraguai e Brasil. Ia do Alto Peru até o Atlântico e da Lagoa dos Patos, no Rio Grande do Sul, até a Cananéia, no atual estado de São Paulo, um dos possíveis motivos que impossibilitou a expansão do Império Inca no sentido leste.
O Peabiru (chegava ou) partia de vários pontos da costa brasileira: Cananeia, no litoral paulista; três pontos no litoral paranaense; e o que mais nos interessa no momento, o ramal que tinha início no litoral catarinense. Ele iniciava na Foz do Rio Itapocu, situada no atual município de Barra Velha. Todos estes ramais encontravam-se com o tronco principal do Peabiru em Castro, próximo a Ponta Grossa no Paraná, e dali a trilha seguia serpenteando rios, sempre buscando o sentido oeste, até o Rio Paraná.
Desenho: Eloar Guazzelli |
Nossa viagem inicia em Florianópolis, penetrando "a trilha" em Barra Velha. Dali seguiremos até o Rio Paraná, buscando reconstituir a antiga trilha e encontrar vestígios desse milenar caminho através de relatos de escritores, historiadores e desbravadores como Cabeça de Vaca, que trilhou o Peabiru pouco depois de Garcia, por volta de 1545 e contou sua aventura no livro "Naufrágios e Comentários", editado no Brasil pela L&PM.
Da fronteira com o Paraguai seguiremos para Assunção, a fim de mergulhar o mais possível na cultura guarani. E dali vamos para a Bolívia, até a região onde Aleixo Garcia teria feito o primeiro contato com os incas. Seguimos as pegadas de Aleixo para mergulhar nos primeiros caminhos intra-continentais e na rica cultura do subcontinente Sul-americano, já que os poucos guaranis que sobraram estão muito ressabiados (com a devida razão) para nos falar abertamente de seus antigos caminhos, que para eles são considerados sagrados.
A experiêcia resultará num documentário cujo projeto foi vencedor do Prêmio Catarinese de Cinema 2014-2015, editado em 2016. Nos próximos posts contaremos em detalhes essa aventura.